Sexualidade na vida das mulheres depois dos 70

A menopausa ocorre nas mulheres em um período que oscila entre os 45 e 55 anos de idade. Essa fase é caracterizada pelo encerramento da menstruação, correspondendo ao momento em que a mulher menstrua pela última vez.

Em alguns casos, a menopausa ocorre antecipadamente, por volta dos 40 anos, por exemplo. Nesse caso, ela é chamada de menopausa precoce.

O climatério é o período que compreende o intervalo entre a fase reprodutiva e a não reprodutiva da mulher. É o período que se inicia um pouco antes da menopausa, e perdura até um pouco depois dela.

Nessa etapa da vida da mulher, ela pode sentir diversos sintomas em decorrência dessa variação hormonal. Ondas de calor, alterações no sono, no humor e até variações na libido são alguns dos traços sentidos durante essa fase.

É a partir desse momento que diversas variações começam a ocorrer no corpo feminino. Mas isso está longe de representar ausência de atividade sexual na vida da mulher.

É inevitável que, conforme envelhecemos, diversas alterações ocorrem em nossos corpos. Na melhor idade, as alterações hormonais estão relacionadas à diminuição dos níveis de estrogênio e isso sem dúvidas pode afetar a sexualidade das mulheres, impactando em variadas disfunções sexuais.

No entanto, esse não é o único fator que influencia a sexualidade feminina nessa etapa da vida. Além dos fatores biológicos, outras condições como contexto social, cultural e religioso, por exemplo, também contribuem para alterações relacionadas à sexualidade na terceira idade.

No contexto sociocultural, por exemplo, podemos abordar a relação que a mulher tem com seu próprio corpo.

A sexualidade não se limita às práticas sexuais, mas também envolve as atitudes gestuais e disponibilidade física, não no sentido performático, mas com relação ao ato de se sentir à vontade com o próprio corpo. A relação com a autoimagem e as interações afetivas complementam esses fatores.

Além disso, a relação sexual vai muito além da penetração.

Geralmente, os homens têm mais dificuldade para compreender isso, dadas as pressões sociais que a sociedade impõe sobre a virilidade masculina. No caso das mulheres, o maior problema que elas enfrentam está relacionado ao tabu na hora de compreender a importância de se tocar. 

Sendo assim, um dos pontos que devem ser valorizados na sexualidade entre as mulheres depois da menopausa é a relação que podem ter com o próprio corpo a fim de se sentirem bem redescobrindo o prazer sozinhas.

Este artigo salienta a importância da sexualidade na terceira idade, bem como a relevância do seu estímulo para uma vida mais sadia e significativa.

O artigo também pretende desmistificar a ideia de que a sexualidade acaba na velhice. Diversas mulheres na casa dos 70 anos demonstram que a crença da diminuição do prazer sexual na melhor idade é uma visão ultrapassada.

Mudanças de paradigmas sobre a melhor idade

“Tem tantos mitos… Hoje em dia vivemos em um mundo no qual as mulheres de 65 anos são as de 20 anos de um século atrás. Idade é algo muito relativo.” 

(Sônia Braga, 70 anos)

O Jornal do Commercio de 4 de agosto de 1960 publicou uma notícia trágica sobre um acidente envolvendo um ônibus que entrou na casa de Maria Oliveira. Mas não foi o acidente que chamou a atenção da web. A notícia viralizou 60 anos depois devido ao teor do seu título.

O Jornal do Commercio é um senhor de 114 anos de existência. Ele costuma publicar edições passadas, mas a viralização aconteceu a partir do compartilhamento do advogado Pedro Lindoso que, em sua página do Facebook, brincou: “Se ela era ‘velhinha’ com 42 anos, então eu, com 61 anos, seria um ancião decrépito?”.

Pedro Lindoso ainda comentou: “O interessante é que todo mundo achou curiosa a ‘velhinha’ de 42 anos. Eu tenho 61 anos e me considero um garotão. Pra você ver como as coisas mudam. Quando eu era criança, achava uma pessoa de 50 anos, ou até menos, velha”, lembrou.

De acordo com o livro “Brasil: uma visão geográfica e ambiental do início do século XXI” do IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, em 1900 a expectativa de vida do brasileiro era de 33,7 anos, em 1960, ano da publicação da matéria, era de 52,5 anos e em 2020 foi para 76,7 anos. 

Isso demonstra as transformações que ocorreram no Brasil com relação à visão que temos sobre a velhice.

Daqui a mais 60 anos, será que matérias que se referem às mulheres de 70 anos como “velhinhas” causarão a mesma reação?

Rompendo tabus

“A sexualidade é vivida e expressa em pensamentos, fantasias, desejos, crenças, atitudes, valores, comportamentos, práticas, papéis e relacionamentos. Enquanto a sexualidade pode incluir todas essas dimensões, nem todas elas são sempre vivenciadas ou expressas. A sexualidade é influenciada pela interação de fatores biológicos, psicológicos, sociais, econômicos, políticos, culturais, legais, históricos, religiosos e espirituais (OMS, 2006).”

A definição da Organização Mundial de Saúde reforça que a sexualidade envolve inúmeras dimensões, ou seja, vai muito além da penetração ou do ato sexual em si. 

Entendendo isso, o próximo passo seria romper com o tabu que muitas mulheres ainda têm sobre a masturbação. 

A sociedade no geral condena essa atitude, uma vez que existem visões culturais e religiosas com relação ao sexo que salientam que ele deve ocorrer apenas para fins reprodutivos. Muitas mulheres por conta dessa perspectiva ainda condenam a atividade sexual por puro prazer. 

Na esteira desse pensamento, muitas mulheres ainda não se sentem à vontade para se masturbarem, resultado de uma crença que nos foi incutida desde a infância.

É importante entender que a masturbação não envolve apenas a estimulação dos órgãos íntimos, mas a redescoberta do próprio corpo, do autocuidado e da autoestima.

O corpo muda com o passar dos anos. Esse autocontato ajuda a receber esse corpo que está em constante transformação, redescobrindo também outras formas de sentir prazer.

Como cuidar da sexualidade na melhor idade

“Uma vida sexual regular tem a ver com saúde. Além de ser saudável, é prazeroso. Relaxa”. 

(Zezé Motta, 76 anos, em entrevista para a Revista Quem)

Se por um lado as alterações fisiológicas afetam a libido, por outro é importante contornar esses sintomas realizando visitas médicas periódicas.

Mas para isso, é preciso romper outra barreira: a do pudor em falar sobre o assunto.

O rompimento da inibição ao falarmos sobre sexo é o primeiro fator que contribui para o estímulo da sexualidade na melhor idade. Aos poucos, conforme essa inibição é rompida, os tabus também são trabalhados.

A socialização é outro fator relevante. Participar de passeios, viagens, eventos, entre outros, contribui para a saúde física, social e psicológica.

A prática de atividades físicas regulares e uma alimentação adequada também contribuem para amenizar os sintomas provocados por fatores fisiológicos, além de melhorar a saúde e o bem estar.

Atualizando as perspectivas sobre sexualidade na melhor idade

“Os que acham que não existe sexo na velhice são jovens, mas, quando chegarem a essa idade, irão ver que é diferente. Quem pensa assim vai ver quando envelhecer que esse pensamento se resume a uma palavra só: preconceito. E de preconceito já estamos cheios. Está na hora de mais uma vez lutarmos contra isso de fato.”

(Fernanda Montenegro, 91 anos, para o site M de Mulher)

Em 2017, Joyce de 82 anos, Shirley de 61 e Dee de 69, concederam uma entrevista ao programa Daily, da rádio BBC 5 Live para falar sobre a sexualidade na terceira idade.

O programa também realizou uma enquete que constatou que a maioria das pessoas entre 60 e 70 anos mantém relações sexuais regulares.

As três mulheres também apontaram que consideram o orgasmo muito melhor em suas fases atuais do que quando eram mais jovens. Uma das entrevistadas atribuiu isso ao conhecimento do próprio corpo. Nessa fase, ela adquiriu maior autoconfiança e menos preocupação com as opiniões dos outros. Essa alteração no pensamento surgiu quando entrou na terceira idade.

A descoberta de novas posições sexuais e possíveis constrangimentos na cama são encarados por elas com humor, fazendo da atividade sexual algo divertido, sem a expectativa de transformar a relação em uma performance.

Uma das observações feitas por elas sobre o sexo quando mais jovens está relacionada à preocupação com a beleza. Quando mais velhas, o contato humano se tornou mais importante do que a preocupação com a aparência, tirando aquela pressão que às vezes ocorria na relação sexual.

Uma delas apontou que a excitação e o prazer são os mesmos, embora com uma taxa hormonal menor. Mesmo sem um parceiro, outra observação apontada foi em relação à masturbação, que se tornou uma forma de sentir prazer consigo mesma.

Como percebemos, as transformações históricas, sociais e culturais, aliadas às mudanças fisiológicas da terceira idade são fatores que precisam ser observados em conjunto quando falamos sobre as alterações na sexualidade  nessa etapa da vida.

Ao contrário do que a sociedade pensa, a atividade sexual na melhor idade é regular, ou pode ser regular, mesmo com as influências fisiológicas provocadas pela queda hormonal.

Manter uma prática sexual é saudável e para isso não estamos falando necessariamente de penetração. A masturbação é uma prática que deve ser estimulada, especialmente nessa fase da vida, pois ajuda a promover uma nova forma de contato e prazer com o próprio corpo.

Mas muitas mulheres ainda precisam enfrentar seus tabus e para isso é importante mantermos aberto o diálogo.

O cuidado com a sexualidade contribui para a autoestima, a socialização e a saúde física e emocional.