“Oxum, Senhora das águas,
Trazei-nos o amor divino.Nanã, Senhora das fontes,
Trazei-nos a renovação do espírito.Iemanjá, Senhora do mar,
trazei-nos a fartura espiritual.Iansã, Senhora dos ventos,
Trazei-nos a limpeza da alma.”
Yabá, cujo significado é “Mãe Rainha”, é o nome utilizado para se referir às Orixás femininas, que também podem ser chamadas de Aiabás, Lyagbas, Iabá, Lyabá ou Aiabá.
A Festa das Yabás é comemorada no Brasil no dia 13 de dezembro. No candomblé, as Orixás femininas homenageadas são Oxum, Iemanjá, Iansã (Oyá), Nanã, Obá e Ewá (Yewá).
Mas essas Orixás também são homenageadas em outras datas. O dia de Iemanjá, por exemplo, é comemorado em 2 de fevereiro, mas também em 31 de dezembro e em outras datas dependendo da região do país.
Além disso, temos o sincretismo religioso presente na cultura brasileira. Em 04 de dezembro, é comemorado o dia de Santa Bárbara, que corresponde à Iansã. Em 08 de dezembro, temos o dia de Nossa Senhora da Conceição, que no sincretismo corresponde à Oxum .
Mas, embora esse sincretismo possa reforçar a resistência dos saberes e da religião africana na cultura brasileira, ao mesmo tempo, quando nomeamos esses feriados com referências cristãs, ofusca-se o lugar do protagonismo das Yabás.
Ainda assim, as Yabás estão presentes em festejos populares dedicados exclusivamente a elas, e em cada uma dessas Orixás nós encontramos aspectos variados do feminino.
Oxum, a grande mãe; Iemanjá, a doadora de bênçãos; Iansã, a guerreira; Nanã, a sabedoria ancestral; Obá, força e ousadia; e Ewá, a vidente são Yabás que fortalecem a formação das subjetividades das mulheres negras em suas mais diferentes vozes.
A seguir, conheça um pouco mais sobre as características de cada uma dessas Yabás e como elas ampliam as possibilidades compreensões do feminino.
Nanã, Orixá da Sabedoria e dos Pântanos
Saluba Nanã (Salve a Mãe das águas Pantaneiras!)
Saudação de Nanã

Dizem que quando Olorum encarregou Oxalá de fazer o mundo e modelar o ser humano, o orixá tentou vários caminhos. Tentou fazer o homem de ar, como ele. Não deu certo, pois o homem logo se desvaneceu. Tentou fazer de pau, mas a criatura ficou dura. De pedra ainda a tentativa foi pior. Fez de fogo e o homem se consumiu. Tentou azeite, água e até vinho de palma, e nada.
Foi então que Nanã Burucu veio em seu socorro. Apontou para o fundo do lago com seu ibiri, seu cetro e arma, e de lá retirou uma porção de lama. Nanã deu a porção de lama para Oxalá, o barro do fundo da lagoa onde morava ela, a lama sob as águas, que é Nanã.
Oxalá criou o homem, o modelou no barro. Com o sopro de Olorum ele caminhou. Com a ajuda dos orixás povoou a Terra. Mas tem um dia que o homem morre e seu corpo tem que retornar à terra, voltar à natureza de nanã Burucu.
Nanã deu a matéria no começo, mas quer de volta no final de tudo o que é seu.
PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás.
Nanã é a Orixá mais antiga, por isso é conhecida como a dona da sabedoria infinita.
Nanã nos apresenta o arquétipo da anciã, da mãe primordial, resgatando a memória mais ancestral. Domina as águas paradas, pântanos e terras úmidas.
É ao mesmo tempo doce e intransigente, carismática e cheia de manias, mas sempre com a palavra certa em todo e qualquer momento. Com sua serenidade e austeridade, Nanã inspira respeito.
Embora considerada a dona da morte, Nanã na verdade é a própria valorização da vida, da amizade e da família, afinal, vida e morte são apenas parte daquilo que é o “viver”, e Nanã nos guia nesse caminho. Ela é responsável pelos portais da encarnação, desencarnação e reencarnação.
Seus nomes são variados: Nanã Buruku, Nanã Borodo, Nanã Buru, Nanã Boroucou, Boroucou, Anamburucu ou Nanamburucu. São filhos de Nanã os Orixás Iroko, Osanyin, Yewá, Omolu, Obaluaiê e Oxumaré. Suas cores são lilás, branco e anil.
Com relação às características das filhas de Nanã, uma das mais relevantes é a calma e a paciência, bem como a tolerância e o perdão. Possuem aquele carinho e cuidado típicos de uma avó que cuida da família e da comunidade.
Iemanjá, Rainha do Mar
Odoyá ou Odocyabá (Salve a Senhora das águas!)
Saudação de Iemanjá

Iemanjá, a senhora das águas, contempla-se em seu prateado abebé (espelho).
Iemanjá é uma orixá tão popular no Brasil que recebe outros inúmeros apelidos como Inaé, Mucunã, Sereia, Dandalunda, Princesa de Aiocá, “Oguntê, Marabô, Caiala e Sobá. Oloxum, Ynaê, Janaina e Yemanjá. São rainhas do mar” (Lenda das Sereias, música interpretada por Clara Nunes).
Assim como Oxum, Iemanjá também é uma orixá requisitada para assuntos do amor e é associada à compaixão e ao perdão. Ela é o próprio arquétipo da maternidade e protege todos os seus filhos.
Iemanjá é mãe de Exu, Ogum, Oxóssi, Xangô e tantos outros Orixás.
Iemanjá nos traz o equilíbrio da cabeça e é requisitada para a paz. A orixá estimula a solidariedade alinhada ao reconhecimento das prioridades, ou seja, ela ajuda, mas em primeiro lugar, pensa si mesma.
Seu espírito de cooperação também é associado ao amparo materno, mas a maternidade em Iemanjá remonta do início dos tempos como nos apresenta Reginaldo Prandi.
Iemanjá vivia sozinha no Orum (a morada dos deuses).
Ali ela vivia, ali dormia, ali se alimentava.
Um dia Olodumare (ser supremo) decidiu que Iemanjá precisava ter uma família, ter com quem comer, conversar, brincar, viver.
Então o estômago de Iemanjá cresceu e cresceu e dele nasceram todas as estrelas. Mas estrelas foram se fixar na distante abóboda celeste.
Iemanjá continuava solitária.
Então de sua barriga crescida nasceram as nuvens. Mas as nuvens perambulavam pelo céu até se precipitarem em chuva sobre a terra.
Iemanjá continuava solitária.
De seu estômago nasceram os orixás. Nasceram Xangô, Oiá, Ogum, Ossaim, Obaluaê e os Ibejis.
Eles fizeram companhia a Iemanjá.
PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás.
Tanto Oxum quanto Iemanjá são associadas à maternidade, mas enquanto Oxum está na qualidade agregadora, na fusão entre o sêmen e o óvulo, Iemanjá é o próprio processo de criação.
Sua fertilidade está nas coisas que produzimos em nossas vidas. É Iemanjá quem estimula a criatividade e a geração da vida.
As filhas de Iemanjá costumam ter aquele ar romântico e sensível. São sensuais, belas e intuitivas, mas como as ondas do mar, as filhas de Iemanjá também são fortes e determinadas.
Oxum, a Orixá dos Rios e Cachoeiras
Ora Yê iê, ô! (Olha por nós Mãezinha!)
Saudação de Oxum

Logo que o mundo foi criado, todos os Orixás vieram para a Terra e começaram a tomar decisões e dividir encargos entre eles, em conciliábulos nos quais somente os homens podiam participar.
Oxum não se conformava com essa situação. Ressentida pela exclusão, ela vingou-se dos Orixás masculinos.
Condenou todas as mulheres à esterilidade, de sorte que qualquer iniciativa masculino no sentido da fertilidade era fadada ao fracasso.
Por isso, os homens foram consultar Olodumare. Estavam muito alarmados e não sabiam o que fazer sem filhos para criar nem herdeiros para quem deixar suas posses, sem novos braços para criar novas riquezas e fazer guerras e sem descendentes para não deixar morrer suas memórias.
Olodumare soube, então, que Oxum fora excluída das reuniões. Ele aconselhou os Orixás a convidá-la, e às outras mulheres, pois sem Oxum e seu poder sobre a fecundidade nada poderia ir adiante.
Os Orixás seguiram os sábios conselhos de Olodumare e assim suas iniciativas voltaram a ter sucesso. As mulheres tornaram a gerar filhos e a vida na Terra prosperou.
PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás.
Adornada com ouro e sentada à beira do rio, Oxum amamenta um bebê e se admira, observando-se em seu espelho dourado.
Oxum é a rainha das águas doces e senhora da beleza. É uma orixá associada à riqueza espiritual e material.
É Oxum quem surge para manter o equilíbrio das emoções. Também é considerada a Orixá do amor, o que faz com que seja muito requisitada para assuntos de relacionamentos.
Oxum é também conhecida com Osúm, Osún ou Oxun. É filha de Iemanjá com Oxalá. Assim como Obá e Iansã, Oxum também foi esposa de Xangô. Suas cores são amarelo, azul ou dourado.
As filhas e filhos de Oxum geralmente são sensíveis e emocionais, mas isso não significa fragilidade, muito pelo contrário. Possuem temperamento calmo e não gostam de conflitos. Mas, não queria irritar uma filha ou filho de Oxum porque águas calmas também afogam.
As filhas de Oxum amam conforto e riqueza e possuem uma autoestima elevada. São muito determinadas e estratégicas e não dispensam energia para alcançar seus objetivos.
Dominando as artes culinárias, Oxum também dobra seus inimigos através do estômago.
Oxum também tem um aspecto maternal. Seu amor puro e incondicional lhe confere o título de “Orixá do Amor Divino” e “Deusa do Perdão”, tudo em nome da harmonia que essa Orixá tanto preza.
Sua fecundidade está nas águas dos rios e nas nascentes que irrigam a terra e proporcionam a fartura das colheitas, e também no ciclo menstrual feminino.
Iansã, Orixá dos Ventos, Raios e Tempestades
Eparrei! (Salve o raio, Iansã!)
Saudação de Iansã

Iansã, com seu charme e beleza, movimenta-se como o vento, ora suave, ora arrebatador. É fiel às suas convicções.
Uma guerreira que não foge às batalhas.
Iansã é uma aliada aos que se sentem perdidos ou estão buscando alguma direção. É Iansã quem controla os ventos e tempestades e também conduz os espíritos desencarnados. Iansã aponta os caminhos.
Sendo assim, as pessoas que se sentem estagnadas, especialmente em decorrência de problemas emocionais, podem ser auxiliadas pela energia ativa e mobilizadora de Iansã.
Iansã também é chamada de Yansã ou Oyá e suas cores são o amarelo e o vermelho. Na umbanda sua cor é o laranja.
As filhas de Iansã costumam ter personalidade guerreira. São batalhadoras dedicadas e incansáveis, e como se entregam em tudo que fazem, tendem a ser bem sucedidas. As filhas de Iansã têm sede de sabedoria.
Assim como o vento, também são livres e extrovertidas e possuem intensa energia sexual, alegria, coragem e ousadia. Amam festejar e não gostam de rotina.
Geralmente são temperamentais, mas tendem a esquecer as ofensas com facilidade, da mesma forma que se arrependem facilmente.
Uma discussão é um prato cheio para as filhas e filhos de Iansã que adoram debates argumentativos.
Geralmente não guardam rancor, mas odeiam injustiças e não disfarçam seus sentimentos.
Obá, a Guerreira Mulher
Akiro Obá Yê! (Eu saúdo o seu conhecimento, Senhora da Terra!)
Saudação de Obá

Com espada e escudo na mão, Obá está sempre pronta para lutar.
Obá é uma orixá que representa força, ousadia e sabedoria. Ela não se curva e luta contra toda forma de machismo. É uma orixá que briga pelos direitos das mulheres.
Obá é filha de Iemanjá com Oxalá. Representa as águas doces revoltas como pororocas e quedas d’água. Ao lado de Nanã, Obá controla as enchentes barrentas. A força de seu elemento da natureza traz a representação de uma Orixá que possui grande força física.
Suas cores são o vermelho e o branco, com detalhes em amarelo e às vezes também se utiliza o rosa. Seu escudo e sua espada são de cobre.
Apesar da força e de sua qualidade guerreira, Obá aparece com um semblante triste, representando seus ressentimentos.
As filhas e filhos de Obá não são muito sociais e por serem muito sinceros, ofendem facilmente e têm dificuldade em fazer amizade. No entanto, quando fazem amizade são extremamente fiéis.
Especialmente as filhas de Obá são geralmente mulheres de garra em suas áreas profissionais.
Ewá, a Orixá da Vidência
Ri Rô Ewá! (Doce, branda Ewá!)
Saudação de Ewá

Ewá significa “mãezinha do caráter” e ela rege os nevoeiros e as neblinas. É a dona dos horizontes e pode fazer seus inimigos se perderem na névoa, mas ela mesma, que já enganou a morte diversas vezes, não se perde.
Também conhecida como Yewá, é a Orixá do sexto sentido. Rainha do céu e do cosmo, ela domina o lugar que a humanidade não alcança e possui o poder da vidência.
É símbolo de beleza e sensualidade e protege os rios, florestas e o próprio ser humano.
Também é associada à pureza, mas Ewa não tem nada de ingênua, sendo uma guerreira muito astuta e sábia.
Ewá é filha de Oxalá com Nanã. Possui uma serpente, o “Ofá” (arco e flecha) usado em guerra, o arpão, e a lira como símbolos. Suas cores são coral, rosa e vermelho vivo, sendo os seus colares nas cores vermelho e dourado.
Ewá tem apenas filhas de santo mulheres. Geralmente são pessoas calmas que manifestam pureza e jovialidade, mas podem repentinamente ser severas. São também adaptáveis ao ambiente em que se encontram.
Gostam de se vestirem bem e com coisas caras e belas.
É a orixá das possibilidades e do mimetismo, já que todos os seres que se camuflam tem a proteção de Ewá.
A Importância das Yabás
Quando temos contato com as histórias das Orixás, reconhecemos as características ancestrais das Yabás e resgatamos a memória ancestral dos povos africanos. É também uma possibilidade de ampliarmos as referências que temos quanto aos aspectos do feminino.
Cada uma das histórias dessas Orixás se comunicam com nossas vidas. Elas narram passagens que remontam da origem do universo. Evidenciam como as Orixás amparam quem precisa de ajuda, ou inspiram nossas atitudes com valores e características que elas trazem para nos auxiliar.
Além disso, conhecer suas histórias contribui para que possamos combater a intolerância religiosa que tem se intensificado no país contra as religiões de matriz africana.
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